quarta-feira, 26 de março de 2008

Aula magna de subversão

Helio Viana

Enquanto os brasileiros vivem a sua rotina – levantam-se, vão ao trabalho e depois retornam às suas casas para se reunirem com suas famílias e prepararem um novo dia –, com a mesma rotina ergue-se, labuta contra eles e volta a seus antros para tramar novas conspirações uma organização subversiva chamada MST, especiosamente rotulada por seus hábeis manipuladores de “movimento social”.

Com fortes apoios em certos meios religiosos e poderes constituídos, o MST tem a missão de coadjuvar o governo na sua marcha rumo ao socialismo. Seu papel é pressioná-lo e obter dele concessões cada vez maiores em matéria de reformas, particularmente a agrária. Pois se a iniciativa de tais reformas partisse do governo, este tiraria a máscara e se indisporia com a opinião pública. A tarefa de “bicho papão” exercida pelo MST deixa assim o governo cômodo para agir, dizendo que está tão-só atendendo os clamores de justiça social de um povo faminto.

O regime feudal baseava-se no binômio proteção-fidelidade: o senhor feudal protegia o servo da gleba e recebia em troca a fidelidade dele. Binômio análogo, embora nos antípodas, dá-se entre governo e MST: o governo lhe dispensa proteção e recebe em troca sua fidelidade.

Apesar de suas invasões – com o conseqüente desrespeito às leis do País – terem neste início de ano aumentado sensivelmente, em vez de ser punido, o MST foi promovido. Com efeito, a seu líder João Pedro Stédile coube uma honra a que poucas notoriedades brasileiras é concedida: foi o convidado especial do reitor Aloísio Teixeira, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), para proferir a aula magna de abertura do ano letivo de 2008, no campus do Fundão.

Diante de uma platéia de cerca de 200 pessoas, entre professores e alunos, aquele agitador profissional desenvolveu o tema “Terra, saberes e democracia”, sendo aplaudido de pé. O que ele disse? Estadeou sua pretensa sabedoria sobre problemas da terra e da democracia, dos quais, como o Brasil inteiro sabe, o MST é grande conhecedor e observador...

Mas o que Stédile de fato revelou em sua aula foi a mais recente estratégia do MST: atacar o trabalho de unidades multinacionais em setores como dos transgênicos e do agronegócio: “Percebemos que nossos inimigos principais agora são as empresas transnacionais. Enquanto houver um sem-terra respirando, vamos lutar para expulsar do País todas as empresas transnacionais que nos exploram na agricultura”, pontificou.

Ou seja, o objetivo dessas como de qualquer outra empresa sendo o lucro, cumpre combatê-las, pois na perspectiva do MST isto é imoral. Como se elas não tivessem também uma função social proporcionada pela mão-de-obra que empregam e pelo próprio fruto desta, a produção, da qual se beneficia toda a sociedade. O MST quer tudo destruir, pois ele só admite a empresa estatal, nos moldes dos falidos regimes comunistas.

Embora tenha se negado a falar de ações planejadas para um “abril vermelho” de invasões, Stédile afirmou que não recuará, mesmo diante da decisão da 41ª Vara Cível do Rio de Janeiro. Chamou a medida de “idiotice” e “ditatorial”, acrescentando que a Vale do Rio Doce está “desesperada”. Várias outras empresas – Monsanto, Syngenta, Aracruz, Stora Enzo, Votorantin, Bayer etc. – estão na mira do MST.

De mais a mais, que autoridade tem Stédile para dizer e agir assim? Quem lha conferiu? Já que ele discorreu sobre democracia, foi por acaso o povo brasileiro? Pelo contrário, este está farto das atividades subversivas desse movimento e de nenhum modo deseja a mudança do atual regime de livre iniciativa e propriedade privada para o regime socialista de propriedade coletiva tutelada pelo Estado, como o pregado pelo MST e por seus minguados adeptos.

Assim, enquanto do alto de uma cátedra provisória na UFRJ, Stédile se arremete sob aplausos contra a ordem estabelecida e o Judiciário, chegando a chamar de “idiotice” e “ditatorial” uma decisão dele, proprietários rurais são vítimas de invasões, roubos e torturas. Tal foi o caso, entre muitos outros, do advogado Rodrigo Macedo, da Fazenda Iara, em Euclides da Cunha Paulista, que acusado recentemente de revidar uma agressão dos sem-terra – “cet animal est très méchant, quand on l’attaque il se défend!” –, teve ainda que purgar seis dias na cadeia!

Em Andradina, no noroeste paulista, cerca de 80 sem-terra ligados ao Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (Sintraf) destruíram há pouco nada menos que três mil pés de café da Fazenda Macaé. Disseram que agiram em protesto pela demora da Reforma Agrária. Um oficial de Justiça entregou-lhes uma intimação solicitando retirada imediata. Eles colocaram tratores na porteira para impedir a entrada da polícia. O dono da fazenda, Eduardo José Bernardes Filho, obteve a reintegração de posse na Justiça. Conseguirá retirá-los? E mesmo que o consiga, quem lhe pagará os prejuízos?

Essa é a rotina, o dia-a-dia do Brasil atual. Por detrás das aparências de normalidade existe uma imensa subversão – pouco sentida pelos citadinos, mas não por isso menos real –, que se não for contida poderá nos levar aos descaminhos aos quais as FARC conduziram a vizinha Colômbia.

quinta-feira, 20 de março de 2008

Direita francesa castiga Sarkozy

No segundo turno das eleições municipais francesas, ocorrido no dia 16 de março, prevaleceu a tendência observada no primeiro, ou seja, um recuo das forças da direita em benefício do Partido Socialista. Com efeito, este conquistou 24 das 36 cidades com mais de 100 mil habitantes, arrebatando ainda à direita 38 localidades com mais de 30 mil habitantes. Tanto o Partido Comunista como a extrema-direita de Le Pen obtiveram resultados inexpressivos.

Contudo, mais do que um avanço da esquerda, o que se observou foi um castigo infligido a Sarkozy por 35% da população de centro-direita que se abstiveram de votar. Não é temerária a afirmação, pois é sabido que o eleitorado de esquerda é disciplinado e não se abstém. Quanto mais no longo e tenebroso inverno político em que se encontra!

Se no próximo quatriênio que ainda tem à sua frente o presidente Sarkozy decidir “queimar o que adorou e adorar o que queimou”, reconciliando-se com a opinião pública que o elegeu com folgada margem de votos há apenas 10 meses, e encetar uma política consoante com as suas aspirações, terá tudo para reverter a situação; caso contrário, esta não fará senão piorar.

A “caixa-preta” de Raúl Reyes

Afora as revelações altamente comprometedoras para Hugo Chávez e Rafael Correa, já referidas neste blog, a “caixa-preta” do computador do farcista Raúl Reyes, morto em operações do exército colombiano no início de março, continua a fornecer novas revelações.

A mais recente delas resultou na apreensão na Costa Rica, com espantosa rapidez e precisão em decorrência dos detalhes proporcionados, de uma caixa metálica enterrada em zona rural, contendo a soma de 480 mil dólares. Esta era uma parte do dinheiro destinado a atividades das FARC naquele país, onde os colombianos ocupam o segundo lugar no contingente de imigrantes.

Mais um alarmante sinal para nós, latino-americanos, abrirmos os olhos acerca da realidade que nos circunda, e nos perguntarmos se o narco-terrorismo farcista não deitou metástases em cada um de nossos países, valendo-se para isso da cumplicidade ou da conivência de pessoas colocadas muitas vezes nos mais altos cargos, a exemplo do que vem ocorrendo na Venezuela e no Equador. – Que novas revelações trará a “caixa-preta” de Raúl Reyes?

Em tempo: No momento de postar esta matéria, leio na imprensa de Lima que em Iquitos, capital da Amazônia Peruana com 438 mil habitantes, acaba de ser detido pela Dirección Contra el Terrorismo, mediante ordem judicial, um casal de farcistas. A captura foi considerada “importantíssima” pelo Gen. Octavio Salazar, diretor daquele órgão, uma vez que o guerrilheiro, Johnny Cárdenas, que atende pelo codinome de Tanaka, é um “peso pesado” da Frente 63 das FARC, conhecido especialista em explosivos e armamentos pesados, autor de fuzilamentos de desertores farcistas e de civis que se negavam a colaborar com a organização. Em seu ativo há ainda diversos atentados contra o exército colombiano. Ele atuava na região de Putumayo, junto à fronteira amazônica com o Peru, obedecendo ordens de Joaquín Gómez, sucessor de Raúl Reyes. Segundo fontes da inteligência colombiana, ele entrou clandestinamente no país vizinho – onde provavelmente se encontram outros terroristas – para ampliar as atividades narco-guerrilheiras das FARC.

Violência, açoite da Venezuela

O nível da violência subiu vertiginosamente nos últimos dez anos na Venezuela chavista. É o que revela matéria de Francisco Peregil, enviado especial a Caracas do jornal espanhol “El País” (18/03/08).

Dados proporcionados por Roberto Briceño, diretor do Observatório Venezuelano de Violência, entidade privada com a qual colaboram quatro universidades, dão conta de que a taxa anual de homicídios triplicou, passando de 4.550 em 1998 – quando Chávez ganhou as primeiras eleições – para 13.200 em 2007!

Segundo a mesma fonte, a taxa de homicídios por cada contingente de 100 mil habitantes passou de 19 em 1998 para 49 em 2006. Para se ter uma idéia do que isso significa, na Espanha essa taxa oscila entre um e dois; na Argentina, alarmada pelo elevado índice de criminalidade ela é de nove; no bang-bang brasileiro ela é de 23; e no México, 24. Portanto, o índice de criminalidade da Venezuela é o dobro do verificado no Brasil ou no México!

O que aconteceu?” – pergunta Briceño. Ele responde: “A hipótese que mantenho é a de que os primeiros mortos por cada 100 mil habitantes têm a mesma explicação que teriam no México ou Brasil. Pobreza, desigualdade... Mas os outros vinte e tantos têm que ver com a quebra do pacto social levada a cabo com este governo. Quando o presidente faz um minuto de silêncio pelo guerrilheiro Raúl Reyes, está criando uma desordem na sociedade.

Um morador da favela Petare – com um milhão de habitantes (1/3 da população de Caracas), administrada por um chavista e palco de atuação dos primeiros médicos cubanos chegados ao país – assegurou ao jornalista que nos finais de semana são ali assassinadas até 30 pessoas, e que só no ano passado houve 700 mortes violentas!

Enquanto cresce a violência, continua a despencar a popularidade de Chavez. Segundo o instituto de pesquisas Datos, em levantamento feito em fevereiro último junto a dois mil habitantes da área urbana, Chávez obteve 34% de aprovação, nove pontos a menos do obtido por ocasião do referendo de 2 de dezembro de 2007.

O sapo e o escorpião

A atual crise migratória entre a Espanha e o Brasil faz lembrar a fábula do sapo que, convencido pelo escorpião a transportá-lo à outra margem de um rio, decidiu fazê-lo sob a condição de não ser picado. Acontece que no meio da travessia o escorpião o pica. Interpelado do porquê rompera o pacto, o escorpião simplesmente lhe respondeu: “Está na minha natureza”.

Do mesmo modo, por mais que existam acordos bilaterais e os respectivos trâmites sejam consagrados, está na natureza dos governos de esquerda – como é atualmente o caso tanto na Espanha como no Brasil – o condão de tornar difíceis todas as coisas, até mesmo as mais simples. “Si se puede complicar, para qué simplificar?” – dizem com humor os hispanos. Como sempre, quem paga são os cidadãos.

domingo, 16 de março de 2008

Colômbia: não baixar a guarda!

Os mandatários da Venezuela e do Equador – apanhados em flagrante delito no crime de colaboração com os terroristas das FARC –, com o mesmo despudor com que trataram a Colômbia durante a recente crise que os estremeceu, acenam agora para ela como se fossem excelentes amigos que nunca tiveram qualquer desentendimento. Ou que se por acaso o tiveram, dele haviam perdido a memória.

Ora, como acreditar em palavras e atitudes de quem não respeita nem sequer o tempo – calmo e sóbrio dissipador de rusgas – para, sem renunciar a seus propósitos, transformar a carranca em sorriso e estender, em atitude de amizade, a mesma mão que há pouco empunhava um punhal?

É óbvio que a guinada repentina de Hugo Chávez e Rafael Correa – que por conveniência deve ser mais cauto – é mais uma prova de que eles foram os grandes perdedores para a Colômbia. Não só no terreno militar e diplomático, mas sobretudo no plano muito mais vasto da opinião pública, tanto colombiana como internacional. E que precisam portanto com urgência mudar de jogo.

Situação que lhes complica mais uma vez a vida. Se o plano inicial de Chávez era a vitória no referendo de 2 de dezembro – que modificasse a Constituição e o consolidasse no poder, para continuar impulsionando Correa no Equador e Morales na Bolívia –, sua derrota deixou manco o tripé. Ainda mais quando se considera que embora Correa e Morales tenham conseguido mudar a Constituição, o êxito deste último ficou por enquanto só no papel, tais as resistências internas que vem encontrando. E que começam a assomar-se também no Equador.

Um dado curioso em tudo isso é que, ao mesmo tempo em que nesses três países se lançavam referendos para modificar a Constituição e perpetuar os respectivos mandatários, no Brasil havia jeitosas sondagens a respeito de um terceiro mandato de Lula... E pari passu o secretário-geral do Itamaraty e ideólogo da política externa brasileira, Samuel Pinheiro Guimarães, fazia em Lima uma conferência em que apoiava os aludidos referendos – com a massa da população previamente trabalhada por programas assistenciais de índole eleitoreira – apresentando-os como se fossem a mais lídima expressão da democracia.

Isso, que fazia pressagiar um plano geral para o continente, foi posto de lado a partir da derrota de Hugo Chávez no referendo de 2 de dezembro. Ele se auto-convidou então a desempenhar junto às FARC – et pour cause – o papel de mediador para a libertação de reféns. Até o momento em que sobreveio a crise decorrente da morte de seu principal interlocutor – e vítima, pois foi uma ligação de Chávez que possibilitou sua localização –, o narco-guerrilheiro farcista Raúl Reyes.

Quais serão o enredo e o desenvolvimento da próxima cena no teatro de operações da América Latina? Seus atores estão no palco, atentos às palavras do soprador. Este ditará atitudes de distensão ou de carranca?

Seja como for, ele só agirá em conformidade com as reações do público, em particular do colombiano, o qual jamais poderá esquecer que uma porção expressiva de seus membros – irmãos, pais, filhos ou parentes – continua seqüestrada nas selvas, agrilhoada e tratada como animais, não sabendo sequer se sairá viva. Cumpre a este público não baixar a guarda!

sábado, 15 de março de 2008

LIVRO NEGRO DA REVOLUÇÃO FRANCESA

O blog da Federação dos Estudantes da Aquitânia publicou, em 13 de fevereiro de 2008, entrevista com o renomado jornalista, ensaísta e historiador Jean Sévillia, autor de várias obras e um dos co-autores do Livro Negro da Revolução Francesa (Ed. du Cerf, janeiro de 2008, 882 pp). Segue abaixo a tradução.


– Qual foi a sua contribuição para esse livro?

– Há dois anos, encontrando-me com o Pe. Renaud Escande, idealizador do futuro Livro Negro da Revolução Francesa, ele me perguntou que contribuição eu poderia dar à obra. Logo em seguida tive uma idéia, posta em execução num texto, à maneira de esboço de resposta para aquela pergunta: “Será comemorado o terceiro centenário da Revolução?”. Na época eu estava mergulhado na preparação de meu livro Moralmente correto, publicado em 2007, e impressionado pela amplitude das mudanças da sociedade e das mentalidades a que assistimos no decurso das últimas décadas. Projetando o mesmo espaço-tempo não mais para o passado, mas para o futuro, disse para comigo que seria interessante interrogar sobre o que restará da Revolução Francesa em 2089. Pergunta que pode ser entendida em duplo sentido: o que restará da Revolução, mas também o que restará da França. A conjectura é um exercício arriscado: tantas previsões, felizes ou infelizes, foram frustradas... Mas não é proibido interrogar, a partir do momento em que se sabe que certos fatos têm conseqüências iniludíveis.

– Que continuidade existe entre este e seus livros anteriores?

– Sou simultaneamente jornalista, ensaísta e historiador. Minha contribuição ao Livro Negro da Revolução Francesa inscreve-se nesta perspectiva: o historiador trabalhou sobre 1789, o jornalista mergulhou em suas lembranças de 1989, e o ensaísta tentou refletir sobre 2089.

– Qual é a idéia-base deste livro?

– A despeito do fato de que todos os historiadores sérios, mesmo os ardentemente republicanos, são unânimes em que a Revolução Francesa apresenta um problema, a imagem oficial – a dos livros escolares do primário e do secundário, a da televisão – mostra os acontecimentos de 1789 e dos anos seguintes como o momento da fundação de nossa sociedade, maquiando tudo aquilo que se quer esconder: o Terror, a perseguição religiosa, a ditadura de uma minoria, o vandalismo artístico etc. Hoje, elogia-se 1789 e nega-se 1793. A Declaração dos Direitos do homem é benquista, mas não a lei dos suspeitos. Mas, como separar 1789 de 1793 quando se sabe que o fenômeno terrorista começa a partir de 1789? Para responder à pergunta, a idéia-base do Livro Negro da Revolução Francesa é mostrar essa face da realidade que nunca é mostrada, e lembrar que houve sempre uma oposição à Revolução Francesa, mas sem trair a História. Queira-se ou não, goste-se ou não da Revolução, é um mapa da História da França e dos franceses. Não poderá ser apagado: cumpre ao menos compreendê-lo.

– Este livro, do qual participaram diversos professores, mostra que o mundo universitário está em vias de mudar?

– O mundo universitário mudou há muito tempo. Lembrem-se do Bicentenário [da Revolução Francesa, em 1989]: de Pierre Chaunu a Jean Tulard, de Reynald Secher aos historiadores estrangeiros que se descobriam então, tal como Alfred Cobban, todos os grandes nomes da pesquisa histórica situavam-se, em graus diversos, numa posição de crítica em relação à Revolução Francesa. É preciso lembrar o papel essencial e paradoxal de François Furet: este homem de esquerda, ligado ao liberalismo mas nunca à contra-revolução, participou fortemente do naufrágio do mito revolucionário nos meios intelectuais. Mas ele não é feito senão de amigos! Depois de 1989, contudo, passou-se uma geração. De onde a idéia, com este Livro Negro, de retomar a questão com novas colaborações, com contribuições em parte novas.

– No quê uma obra sobre a Revolução Francesa ainda pode interessar os franceses de hoje?

– Numa sociedade que se defronta com uma verdadeira depressão cultural, existe ainda um público cultivado e que lê. Se o Livro Negro chegar a esse público, já estará bem. Observa-se há anos um verdadeiro fascínio pela Idade Média. Nas multidões que vagueiam pelos castelos do [vale do] Loire ou de Versailles, ou na voga da música antiga, encontra-se um interesse pela civilização pré-revolucionária. Chegará o momento em que esse público verá de frente a história da Revolução, pronto a ser modificado em suas certezas. Mas, a se crer na receptividade que encontrei com meu livro Historicamente correto, uma obra que atingiu sem dúvida meio milhão de leitores, há muita gente na França pronta para objetar contra alguns mitos históricos estabelecidos. Espero que o Livro Negro da Revolução Francesa, do qual não sou senão uma das múltiplas vozes, contribuirá para isso.

quinta-feira, 13 de março de 2008

LIVRO NEGRO DA REVOLUÇÃO FRANCESA




Reabilitação da Rainha Maria Antonieta

Na França, país cuja história influenciou profundamente o regime político e a vida social e cultural de todos os povos ocidentais, estão na ordem do dia dois acontecimentos de grande significado.

O primeiro deles é o espetacular lançamento, pelas edições du Cerf, do Livro Negro da Revolução Francesa, de 882 páginas. Elaborou-o, sob a direção do Pe. Renaud Escande, OP, um pequeno batalhão de 46 historiadores, entre os quais Pierre Chaunu, Jean Tulard, Emmanuel Leroy-Ladurie, Jean-Sévillia e Jean-Christian Petitfils. É o Tribunal da História julgando o Tribunal Revolucionário de 1789. Lançado em janeiro de 2008 ao preço de 44 euros, já está na terceira edição. Em apenas três semanas, escoaram-se 10 mil exemplares!

Aliando erudição com farta documentação, seus autores recompõem para a posteridade o verdadeiro rosto da Revolução Francesa – sanguinária e cruel, perseguidora da Religião e da Monarquia – que os manuais de história, a literatura, os meios acadêmicos e de comunicação social insistiam até há pouco em apresentar sempre maquiado.

Eis as palavras introdutórias ao Livro Negro da Revolução Francesa:
“Legítimos e gloriosos, festivos e fraternais, frutos de uma ‘razão’ esperada pelos séculos: é assim que são habitualmente apresentados os acontecimentos daquele que foi um dos períodos mais sangrentos da História, inaugurando tragicamente uma sucessão de revoluções e de conflitos que marcaram a Europa até a metade do século XX.

“É sempre do interesse de uma nação fazer brilhar alguns mitos fundadores, e do interesse dos que tomaram o poder, de mascarar a violência e arbitrariedade sobre as quais eles impuseram sua dominação. Mas a História não é escrita como a mitologia, e sua exigência de verdade não deveria ser atravancada por pretensões utilitaristas. Esta obra não pretende ‘enegrecer’ fatos que falam por si. Esta violência inaudita – que entretanto se reclamava das Luzes – produziu uma onda de choque tal, que deveria estender-se por diversas gerações. Ela levou consigo, sobre o fenômeno revolucionário, toda uma série de obras e de reflexões críticas, das quais se nega muito rapidamente, com freqüência, a legitimidade.”
* * *

O segundo acontecimento diz também respeito à reconstituição da verdade histórica sobre a Revolução Francesa. Trata-se do anúncio de uma grande exposição sobre a Rainha Maria Antonieta, a realizar-se no Grand Palais a partir de 15 de março de 2008. O semanário “Valeurs Actuelles” dedicou-lhe uma substanciosa matéria de capa intitulada “Maria Antonieta superstar”, que seu colaborador Laurent Dandrieu inicia com estas palavras: “Maria Antonieta volta ao centro da atualidade. O tempo joga a favor da mais vilipendiada das rainhas da França, que não cessa de cativar os corações e as imaginações.

São as voltas que a História dá: em nome da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade, a Revolução Francesa cometeu os piores crimes que imaginar se possa. E, a exemplo do que sucede com os criminosos, acabou, também ela, no banco de réus... Enquanto isso, “a mais vilipendiada das rainhas”, Maria Antonieta, injustamente condenada à guilhotina pela turba revolucionária, desce das sombras do cadafalso e dá início a uma ascensão rumo aos galarins da glória. Nos braços do povo francês.

terça-feira, 11 de março de 2008

Equador x Colômbia: Epílogo

Passado o vendaval que levou para a eternidade terroristas da FARC, deslocou exércitos e pôs de sobreaviso a diplomacia internacional, o que restou?

Respondemos: o vendaval passou, mas a crise ficou instalada. E será questão de tempo para que ela volte a aquecer-se, posto que seus fautores intencionais continuam no panorama. Só que desmascarados e sem graça, devendo esperar que seus fracassos caiam no olvido para mais tarde reincidir.

O que se viu foi de suma gravidade: um país livre como a Colômbia, que luta para expulsar um inimigo interno, assassino de sua população, abastecedor mundial de drogas e desejoso de transformá-la em república socialista, obrigado a defrontar-se com dois países vizinhos e amigos, porque seus atuais governantes são cúmplices desse inimigo interno!

Uma vez que o expansionismo socialista permanece na América Latina, agora com face abertamente belicista, por mais que os embaixadores tenham regressado a seus postos e os exércitos às suas bases, a crise ficou pairando no ar, à espera de novos ventos.

A meia-sola de Zapatero

As eleições legislativas espanholas de 9 de março confirmaram o atual chefe socialista de governo, José Luis Zapatero, para o próximo quatriênio. Só que seu partido, o PSOE, contrariamente à folgada maioria esperada – necessitava de 176 cadeiras para constituir maioria – obteve uma vitória de meia-sola: 169 assentos, contra 153 do oposicionista Partido Popular (PP).

Para aprovar seus projetos, Zapatero precisará agora do apoio do partido catalão de centro-direita CIU, com 11 deputados, porquanto os demais partidos de esquerda não possuem representantes suficientes para assegurar maioria ao PSOE.

Muito curiosamente, repetiu-se o sucedido em 11 de março de 2004, quando um grande atentado terrorista em Madrid viabilizou sua ascensão ao poder. Também agora Zapatero se beneficiou de um atentado atribuído ao ETA dois dias antes do prélio, na localidade basca de Mondragón. A vítima fatal foi um ex-vereador do PSOE, e o crime – fartamente noticiado pela mídia – causou grande comoção nacional, auferindo votos para o partido.

Este segundo governo, contudo, não será fácil para o primeiro-ministro socialista, o qual já adiantou que evitará “crispações”. Se na refrega eleitoral Zapatero se defrontou com um opositor medíocre como Mariano Rajoy, terá agora de enfrentar pelo menos uma metade mobilizada da Espanha, que tem manifestado cada vez mais sua indignação ante a destruição de seus fundamentos tradicionais e católicos pelo PSOE.

Sarkozy, coveiro da direita francesa

Eleito com ampla margem de votos pelo eleitorado de direita no início de 2007, o presidente francês Nicolas Sarkozy demorou menos de um ano para decepcionar esse mesmo público, transformando-se em coveiro de suas esperanças.

Como candidato, ele entusiasmou os conservadores com um discurso de apoio à família e às instituições tradicionais, e de franca oposição às idéias libertárias e anárquicas de Maio de 1968. Depois de eleito, contudo, passou a decepcioná-los. Primeiro ao convidar políticos socialistas para compor seu governo, preterindo aliados, e depois por escândalos na sua vida privada, ao contrair terceira união com uma modelo.

Fatos como esses tiveram notável repercussão no primeiro turno das eleições municipais de 9 de março na França, servindo para desestimular o eleitorado conservador e revigorar as minguadas forças do decadente Partido Socialista. Este saiu vencedor por pequena margem de votos, prevalecendo na maioria das grandes cidades, mas perdendo no interior, quadro passível de ser revertido no segundo turno de domingo próximo.

A esta altura os esquerdistas já devem ter dito: “Merci, Sarkozy!”

sábado, 8 de março de 2008

Equador x Colômbia: O verdadeiro motivo do conflito

O que sobressai do atual conflito entre o Equador e a Venezuela, de um lado, e a Colômbia de outro, mais do que uma questão de violação de soberania é o seu caráter ideológico.

Enquanto Rafael Correa e Hugo Chávez imprimem a seus governos um rumo cada vez mais à esquerda – no que são apoiados discretamente pela Rússia de Putin e ostensivamente por Cuba e pelo Irã –, o colombiano Álvaro Uribe chefia um governo de centro-direita, apoiado pelos Estados Unidos e, em alguma medida, por países europeus.

No espectro latino-americano há ainda, alinhados ao bloco da Venezuela e do Equador – do qual Cuba é a tintura-mãe –, países como a Bolívia e a Nicarágua. São os da marcha rápida, que não ocultam sua meta. E outros que, sem pertencerem àquele bloco, são governados por esquerdistas que o criticam em um ou outro ponto secundário, mas que mantêm em relação a ele uma atitude de simpatia e colaboração.

Os governos destes últimos não podem, por injunções de opinião pública, levar a esquerdização em seus respectivos países além de certo ponto. Isso os obriga a caminhar com cautela, sem revelar a meta: “Marchons à petits pas, ne faisons point de bruit; écoutons, parlons bas” (Andemos devagar, sem fazer barulho; escutemos, falemos baixo). Estão neste caso a Argentina, o Brasil, o Chile e o Uruguai.

Por aí torna-se fácil aquilatar a dimensão do desafio do governo de Álvaro Uribe, ao ter que se defrontar simultaneamente com dois adversários com laços recíprocos: o interno (as guerrilhas) e o externo (o bloco de esquerda chamado bolivariano, seus aderentes e simpatizantes).

Apoiado moralmente pela esmagadora maioria da opinião pública colombiana e logisticamente pelos Estados Unidos, o governo Uribe decidiu enfrentar de viseira erguida o desafio.

Para isso ele encetou caminho oposto ao trilhado pelos seus antecessores. Estes vinham fazendo contínuas concessões à narco- guerrilha, a ponto de lhe destinar um “santuário” do tamanho do Estado do Rio de Janeiro, onde o exército simplesmente estava impedido de entrar! O presidente Uribe, pelo contrário, assumiu em relação a ela uma política de “tolerância zero”.

Adotou esta política por considerá-la a única resposta adequada aos grupos marxistas-leninistas que há 40 anos ensangüentam a vida pública e os lares colombianos. De sua sanha assassina não escapou praticamente uma só família, num país de mais de 40 milhões de habitantes: seja por seqüestro, seja por morte, seja por seqüestro seguido de morte; sem falar das volumosas extorsões financeiras, das migrações e emigrações.

E Álvaro Uribe não se equivocou. Com tal política, seu governo vem obtendo êxitos notáveis. Não só ao reduzir praticamente à extinção o ELN, como também ao vir tangendo cada vez mais as FARC rumo à mesma direção. Prova disso é que os guerrilheiros agora mortos julgavam-se abrigados do outro lado da fronteira, em território equatoriano, de onde inclusive telefonavam para Hugo Chávez e outros supporters.

Essas guerrilhas, além de grandes disseminadoras de drogas para o mundo inteiro, têm a declarada intenção de transformar a Colômbia numa república socialista. É compreensível, pois, que um golpe mortal desferido contra elas doa especialmente naqueles que compartem os seus objetivos.

Foi o que aconteceu com Hugo Chávez e Rafael Correa, do hard core do referido bloco e pregoeiros do “socialismo do século XXI”: a notícia da morte do farcista Raúl Reyes e de seus comparsas – quanto mais tendo ocorrido no quintal de um deles – caiu como um raio, fazendo-os como que sentir na própria pele os efeitos letais dos artefatos lançados pela Força Aérea colombiana contra os narco-terroristas.

Fazendo coro com a Venezuela, a Nicarágua e a Argentina, o Brasil – que se nega a reconhecer as FARC como terroristas –, endossou o pedido do Equador à OEA, de uma “condenação hemisférica” da Colômbia. Antes, nosso governo já havia declarado “muito grave” a atitude colombiana. Mais circunspeta foi a OEA. Em sua resolução, ela reiterou tão-só o princípio da inviolabilidade do território, evitando impor à Colômbia qualquer sanção. Seria aliás decepcionante imaginar o contrário, uma vez que Chávez já violou a soberania de diversos países ao intervir na política interna destes em momentos delicados e nunca foi punido.

Embora qualquer violação de soberania seja muito grave, nosso governo simplesmente afirmou o princípio, sem descer à consideração das circunstâncias concretas que cercaram a ação colombiana. E nisso foi incoerente. Pois assim como a soberania de um país deve ser respeitada, também pelo mesmo princípio deve ser respeitado o direito de propriedade no interior de cada país, uma vez que o proprietário legítimo é soberano no âmbito do que lhe pertence.

Mas como o governo Lula restringe o direito de propriedade em nome de uma distorcida “função social”, e permite que hordas invasoras do MST o violem a seu bel-prazer, seria então o caso de perguntar: que maior “função social” poderia haver, no caso que nos ocupa, do que tirar de circulação alguns malfeitores que faziam o pior dos males a mais de 40 milhões de pessoas? Os direitos da maioria não devem, também aqui, prevalecer sobre os de uma minoria?

Compreendeu-o bem a OEA com bom senso e equilíbrio, ao reconhecer no fundo que a arremetida colombiana se justificava à vista de uma importante “função social”. No que foi confirmada pela reunião dos Chefes de Estado latino-americanos, realizada pouco depois na República Dominicana, na qual a Colômbia entrou com coragem e saiu com honra.

quinta-feira, 6 de março de 2008

O Farcismo e seus aliados

Imaginemos uma aldeia em recôndita zona rural. Seus membros são atacados, seqüestrados e mortos por bandidos que depois se refugiam em densos matagais da região. Os donos das terras onde estão esses matagais, ou desconhecem aquela ingrata presença, ou conhecem e nada podem fazer, ou por fim, conhecem e nada querem fazer para impedi-la.

Após muitos seqüestros, extorsões e mortes, a comunidade se reúne e decide pôr fim àqueles desmandos. Imaginemos ainda que no local o contingente da polícia é pequeno, seus agentes têm família e temem se meter com aquela gente. Não mais existindo para quem apelar, os aldeões se organizam e “limpam a área”.

Qual deveria ser, nessa hipotética circunstância, a reação dos donos dos matagais? De protesto por terem sido invadidos sem prévia autorização? Ou de gratidão por se terem visto livres dos bandidos?

Essa imensa aldeia é a Colômbia. Com seus mais de 40 milhões de habitantes, quase não existe família que não tenha sido dilacerada por algum crime das FARC ao longo dos últimos 40 anos. Os governos não as combatiam e, como fez o de Andrés Pastrana, antecessor de Uribe, as FARC foram beneficiadas com um “santuário” do tamanho do Estado do Rio de Janeiro em pleno coração da Colômbia. A partir dali seus membros praticavam os piores crimes e depois regressavam, sem que o exército pudesse intervir.

Tendo o governo Uribe acabado com essa regalia, os guerrilheiros não tiveram outra alternativa senão adentrar-se no mais profundo das selvas da Colômbia, ou ir para a Venezuela e o Equador. Foi neste último país que as FARC perderam Raúl Reyes, sob certo ângulo o mais importante de seus membros.

Chamou contudo atenção a falta de reação imediata do presidente Rafael Correa diante do acontecido. Ele esperou que seu aliado e patrão ideológico Hugo Chávez o fizesse, para depois atuar em total consonância e mimetismo com ele. Tanto no campo diplomático como no militar, agiu como se o Equador não fosse um país soberano.

Em qual das duas situações a soberania de um país é mais ferida: quando tropas de outro país vizinho e amigo penetram, momentaneamente e em legítima defesa, em dois quilômetros recônditos de seu território, sem prejuízos físicos ou materiais para seus habitantes, mas tão-só para agir contra um terrível inimigo que ali se embrenhou? Ou quando o presidente desse país pauta servilmente sua atuação em consonância com o presidente de outro país?

A pergunta toma mais propósito quando este último não é uma pessoa dotada de saber, de bom senso, que goza de merecido prestígio junto à opinião pública de seu país. A este título ele poderia ser um bom conselheiro a ser ouvido, e até imitado. Mas trata-se de um desequilibrado e despótico, sem apoio dos seus e, ainda mais, com o condão de envenenar o relacionamento interno e externo de diferentes nações.

Hugo Chávez, com efeito, não só se intrometeu na vida interna de outras nações que estavam em conjunturas políticas difíceis, mas se assenhoreou de tal modo do governo de uma delas – a Bolívia –, que ameaçou os bolivianos com um banho de sangue caso eles se insurgissem contra as pretensões ditatoriais de Evo Morales e o derrubassem!

E ele portanto não tinha por que meter o nariz – aqui, sim, a expressão é apropriada – numa questão entre a Colômbia e o Equador. Questão, ademais, que não era de fundo entre os dois países, mas surgida em função de um inimigo que se internara nas selvas equatorianas para dali continuar ordenando ataques mortais contra o exército e a população colombiana. E também – quem sabe? – combinar lances de propaganda com Hugo Chávez, Piedad Córdoba, além de outros aliados das FARC...

Se o atual governo equatoriano se despojasse dos preconceitos do sectarismo vermelho e tivesse todo o zelo em preservar a soberania do país, deveria, pelo contrário, ser agradecido à Colômbia. Pois esta, além de em nenhum momento ter agredido o Equador, atuou pelo contrário para a salvaguarda dos princípios democráticos em nome dos quais o governo equatoriano e os da região afirmam reger-se.

Mas infelizmente ele não agiu assim. Foi hostil ao benfeitor e subserviente ao ditador venezuelano. Seguiu-lhe o gesto de romper relações com a Colômbia e, à imitação de sua atitude perigosa e provocadora, enviou tropas à sua fronteira.

Por que o presidente Rafael Correa, ao reclamar da invasão das tropas da Colômbia, não reclamou também das FARC, que desrespeitaram a soberania do território no qual se haviam embrenhado? A menos que elas estivessem ali com conhecimento e aprovação do governo do Equador...

Falam neste sentido documentos “tremendamente reveladores” encontrados pelo exército colombiano nos computadores dos guerrilheiros (altamente informatizados!), em especial no do chefe Raúl Reyes. Tais documentos tiveram sobre a opinião pública o efeito de uma bomba, mais espetacular do que as que vitimaram aquele narco-guerrilheiro e seus companheiros de crimes. Pois conferem às ações das FARC uma extensão inter-governamental.

Segundo tais documentos, entre outras coisas, Chávez destinou 300 milhões de dólares à guerrilha colombiana. E o ministro do Interior do Equador, Gustavo Larrea, de codinome “Juan”, visitou os guerrilheiros das FARC em nome do presidente Rafael Correa, para intermediar posteriores contactos entre o governo equatoriano e as FARC! Mais. Entre outras medidas que “Juan” deveria adotar, estava a de providenciar a substituição das forças policiais equatorianas lotadas na região onde atuavam os guerrilheiros, por outras corrompidas que lhes facilitassem o serviço.

Esses “tremendamente reveladores” documentos revelam assim alguns aspectos de uma imensa conjuração farcista, para a qual concorrem possantemente os atuais governos da Venezuela e do Equador.

Aliados à Bolívia e vistos com simpatia ou displicência – para dizer pouco – por outros governos, eles parecem desejar, pela força das armas, lançar-se a uma nova aventura, a fim de tentar operar no continente uma mudança sócio-político-econômica que não conseguiram obter pela via das reformas. É esta, aliás, a explicação mais plausível para todo o arsenal bélico que Hugo Chávez vem acumulando.

domingo, 2 de março de 2008

Parabéns, Colômbia!

Fazendo eco ao clamor popular das portentosas marchas anti-FARC que reuniram, em 4 de fevereiro, entre 10 a 15 milhões de pessoas nas ruas das principais cidades da Colômbia, seu exército assestou, na madrugada de ontem, 2 de março, o mais duro golpe contra aquele grupo comunista e narco-guerrilheiro até o momento.

O alvo desta vez foi Raúl Reyes, o segundo na hierarquia das FARC e porta-voz internacional do grupo. Ele morreu na selva equatoriana, juntamente com 16 integrantes de sua coluna, a 1800 metros da fronteira com a Colômbia. A aviação colombiana abriu fogo contra o acampamento guerrilheiro, que foi depois tomado por um contingente do exército. Na ação morreu o soldado Carlos Hernández León, festejado em seu país como herói nacional.

A notícia caiu como uma bomba na Colômbia, cuja população se solidarizou com o governo pelo formidável tento. No espaço reservado a comentários, na página virtual de “El Tiempo”, o principal jornal do país, regurgitaram as mensagens. Eis algumas:

– “... isto é melhor do que vencer de 10x0 a Argentina ... do que ganhar do Brasil, do que golear a Alemanha. Isto é golear o gorila Chávez, o títere equatoriano, a Piedad Córdoba. Tirofijo [septuagenário líder das FARC], aproveita e morre de velho, porque vamos por ti...”

– “Que vá agora fazer terrorismo no inferno!!!”

– “Não estou de acordo em assistir a essa farsa de marcha de 6 de março [organizada pelas esquerdas], pois isso é apoiar a Piedad Córdoba, ao orangotango Chávez e a todos esses miseráveis do Polo [partido da esquerda] e as FARC. Claro que se fosse para celebrar este maravilhoso acontecimento de hoje, estou certo de que sairia o dobro de gente que saiu em 4 de fevereiro. Realmente, hoje sim, é um belo dia”.

– Que o enterrem na Venezuela, para que os vermes da Colômbia não se envenenem!”.

– “Esta conversa de que a Ingrid está doente não é senão para pressionar o governo para que libere a área que querem [as FARC], porque lhes convém para se encherem de armas...”

– “... Quem não apóia o governo colombiano, que vá para a Venezuela onde [está] o chefe supremo das FARC; mas isso sim, sem despesas para os colombianos. ... Não me alegro pela morte do tipo, mas sinto um refrigério; oxalá caiam mais assim. Avante, exército colombiano! É melhor trazer 50 corpos de mártires do que ter um país inteiro neste soçobro...”

Enquanto assim se manifestava o povo colombiano, vítima há décadas das piores atrocidades das FARC, Hugo Chávez e seu êmulo equatoriano, Rafael Correa, ficaram indignados, tomando as dores dos guerrilheiros, como se tratasse de pessoas inocentes, e não dos piores e mais frios assassinos. Ambos exigem explicações da Colômbia como se um ultraje tivesse sido feito à humanidade! Chávez pediu um minuto de silêncio pelo guerrilheiro, fechou a embaixada em Bogotá e afirmou que, se isso tivesse ocorrido na Venezuela, haveria guerra! Mais uma eloqüente amostra do “humanitário” e “compassivo” mediador dos reféns das FARC!

Ora, o presidente Uribe havia telefonado a Rafael Correa avisando-o da operação. Procedeu como alguém que atacado continuamente por bandidos que depois se refugiassem impunemente em terreno baldio de um vizinho cúmplice, participava a este da retaliação em legítima defesa.
Mas para bem aquilatarmos quem são essas “maravilhosas” pessoas das FARC, tão queridas daqueles dois chefes de Estado (e provavelmente de outros que não se pronunciaram...), eis um dos inúmeros crimes que elas cometeram contra vítimas inocentes. Retirei esta notícia do referido jornal “El Tiempo”, de 9 de março de 2006:

Eles a mataram por resgatar o cadáver de seu esposo

A última vez que seus 27 alunos a viram, Luz Myriam Farias estava nervosa e não parava de chorar. Tinha ido à escola do vilarejo Caño Claro escusar-se, porque não podia dar aula. Devia partir para Tame (Arauca), a fim de buscar o cadáver de seu esposo. Pediu a uma vizinha para cuidar de sua casa até seu regresso. Seu marido, o governador indígena dos ghaíbos makaguán, Juan Ramírez Villamizar, tinha sido assassinado no domingo pelas FARC, quando voltava das compras em Tame.

Na terça-feira, cheia de angústia ao saber da notícia, Luz Myriam pediu emprestado um cavalo, e se dispôs a viajar sozinha. Mas teve que apear do animal, quando lhe avisaram que tinham visto o corpo de seu esposo em Quenane, a uma hora dali.

Em seguida ela foi procurar o único telefone do vilarejo, e telefonou para a Personería de Tame e à Associação de Cabildos e Autoridades Tradicionais Indígenas de Arauca (Ascatidar), para coordenar o envio de um carro fúnebre. Com uma foto do governador na mão e acompanhada por três pessoas do povoado, conseguiu um veículo e empreendeu viagem.

Não o deixaram regressar

Segundo a Polícia, Juan Ramírez saiu de moto no domingo. Ao voltar, foi interceptado por guerrilheiros. Depois de ameaçá-lo por ter desacatado a ordem de proibição de circular, tiraram-lhe o veículo e o levaram para as montanhas. Dispararam três vezes na sua cabeça e o deixaram atirado próximo da estrada.

Ali o encontrou Luz Myriam, e todos subiram no carro. Quando regressavam, o carro fúnebre se deteve abruptamente. Foram surpreendidos por uma barreira ilegal das FARC, no lugar conhecido como Flor Amarillo. Ali, segundo disseram testemunhas, os subversivos obrigaram a professora a descer do veículo, e sem dizer palavra dispararam duas vezes na sua cabeça.

A Frente 10 das FARC deu ordem para não se transitar pelas vias dos sete municípios do Arauca a partir de 23 de fevereiro. As perdas no departamento [estado] são estimadas em 10 bilhões de pesos. Ainda não se sabe quem substituirá Luz Myriam, que aos 26 anos pensava entrar na universidade. O féretro se realizou ontem em Tame.