sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

O adeus de Eluana


A morte de Eluana – a jovem italiana que sobreviveu 17 anos aguardando a hora em que Deus a chamasse – recordou-me o que amiúde sucede com certos prédios em vias de ser tombados: da noite para o dia são demolidos, a fim de evitar o tombamento. Assim, enquanto no Senado se discutia uma lei que salvaria aquela desditada jovem e tantas outras pessoas da eutanásia, em uma clínica particular de Udine a picareta da morte abatia-se inclemente sobre sua cabeça.

Os que perpetraram esse nefando crime esqueceram-se de que, contrariamente ao que sucede com os prédios, o “monumento” Eluana, cuja “demolição” era desejada pelo próprio pai, mais do que pertencente a ele ou à família, era patrimônio intocável de Deus, Autor da vida.

Mas – perguntará alguém – por que tanto alvoroço em torno de uma moça que até então era desconhecida do mundo? Havia, da parte dos que desejavam seu fim imediato, grande apreço por sua pessoa? – Não, simplesmente queriam que ela "deixasse de sofrer”, ainda que para isso devessem ser utilizados meios ilícitos como a eutanásia.

Esse horror ao sofrimento conduz a extremos impensáveis. Por exemplo, ao que levou a leitora de certo jornal a manifestar sua indignação por uma fotografia publicada na edição anterior. A foto mostrava um cavalo atrelado pelo cabresto à garupa de uma motocicleta, enquanto por uma corda atada à sua cauda ele puxava uma motocicleta estragada e seu respectivo condutor.

Por maior que seja o mau gosto da brincadeira, meçamos contudo o modo como a leitora se refere aos protagonistas da cena, e nos perguntemos se ela seria tão enfática ante a notícia de um aborto ou de uma eutanásia – por exemplo, a que ceifou a vida de Eluana:

“Escrevo indignada, chocada e completamente estarrecida com a foto cruel estampada na página 2. São covardes, cruéis, imbecis, sem rosto, sem alma, sem mãe, nem pai. Essa é a definição para estes dois monstros, que simplesmente se acham no direito de pegar um animal e usá-lo da maneira mais cruel que uma mente doente poderia usar. Tenho pena de quem convive ou ao menos conhece esses dois indivíduos.”

Mas a mentalidade do homem contemporâneo, feita de horror ao sofrimento, é que se não for corrigida pode levá-lo a se tornar um verdadeiro monstro. Pois com freqüência o tem conduzido a aprovar ou praticar atos contrários à razão e à sua própria natureza, que não se vêem nem sequer nos animais.

Assim, foi de um lado em torno dessa aversão ao sofrimento, e, de outro, da compreensão de que ele é parte integrante da vida, que se posicionaram pessoas no mundo inteiro em torno do “caso Eluana”.
Mas, seja como for, a aprovação da eutanásia tem levado a situações impensáveis.

Na Bélgica, por exemplo, onde ela já foi aprovada, muitos idosos saudáveis têm se mudado para a Alemanha, junto à fronteira com o seu país, com receio de os próprios familiares lhes encurtarem os dias...

Estranho paradoxo: em nosso tempo, no qual como nunca se falou de paz, nunca se matou tanto. Mas muito mais do que nas guerras ou em decorrência da criminalidade generalizada, o que mais matou foi o egoísmo humano: sua sede de prazer engendrou o aborto e a eutanásia como instrumentos para tentar edificar na Terra um “paraíso” sem Deus.

Parafraseando Voltaire, homem sem moral e sem Deus, que ao partir da Holanda resumiu suas impressões de viagem na apóstrofe “Adieu, canaux, canards, canaille” (Adeus, canais, patos, canalha), com muito mais razão podia Eluana exclamar, ao partir definitivamente daquele Velho Mundo cada vez mais sem moral e sem Deus, no qual o elemento muçulmano vai sobrepujando o europeu: “Adieu, sarrasins, européens, assassins!” (“Adeus, sarracenos, europeus, assassinos!”).

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